Ovatsagu

O que irei fazer aqui não é bem uma resenha, mas sim comentar uma reflexão que tive enquanto assistia a esse filme.

Vendo filmes como esse, só consigo pensar em como limitamos a nossa relação com a arte. É muito comum ver comentarem o estereótipo do cinéfilo que só gosta de filme preto e branco de 1950. Porém, para além da piada e satirização que se tem nisso, é importante analisarmos até que ponto isso é verdade. O cinema precisa ser complexo, profundo ou técnico? Talvez esse questionamento nos afaste do ponto crucial da discussão: a arte precisa fazer sentir.

Esse não é um filme técnico, uma produção inovadora, um filme com visuais deslumbrantes. Porém, isso não o torna menos arte ou menos cinema, assim como, se fosse técnico ou uma produção complexa em sua montagem, não o tornaria mais arte ou mais cinema. No fim das contas, a principal fórmula é como iremos sentir esse filme, como iremos sentir a arte. Entenda, a argumentação aqui não busca elevar o nível da discussão para um campo onde o sentir tornaria a experiência individual e indiscutível, mas sim refletir um pouco sobre como consumimos e digerimos arte, nesse caso, cinema.

O que vale mais: um filme complexo, um filme técnico ou um filme profundo?

E, para além disso: o que vale um filme? O que vale a arte?

O nosso conto de fadas brasileiro, ou o nosso conto de fodas. Falsa Loura é provavelmente um dos filmes mais ácidos que o cinema brasileiro produziu nos anos 2000 e, sobretudo, um filme que resgata a tradição do nosso cinema na forma de contar sua história e fazer sua crítica.

São Paulo é o estado mais populoso do nosso país e também o que tem a cidade mais industrializada. O que torna essa cidade tão claustrofóbica vai além da grande população, é a massividade do cenário urbanizado que individualiza e invisibiliza quem lá habita. A cidade que fabrica sonhos e vende desejos.

Falsa Loura, com uma expertise brilhante, consegue expor todo o drama de Silmara, que tenta sonhar, mas é constantemente interrompida pela cidade. Silmara, que se fantasia com o seu falso louro, tal como Cinderela com seus sapatos de cristal ou Branca de Neve com seu príncipe heroico. Mas Silmara não pode ser princesa, e sua vida não pode ser um conto de fadas, pois, enquanto sua alma é enganada, seus sonhos de isopor são sempre quebrados pela bruxa má dessa história: a realidade.

O found footage é um dos gêneros do terror que, ao meu ver, tendem a ter uma premissa simples, mas exigem uma realização complexa, uma vez que simular o real é mais difícil do que ficcionalizar. E para mim, os maiores defeitos de "Late Night with the Devil" se encontram na contradição narrativa, o que traz a quebra de imersão a história.

A sensação que tenho é que falta coragem aqui para assumir a persona de terror. O filme começa como um pseudodocumentário que nos apresenta diversas possibilidades de história sobre esses personagens, que parecem ser esquecidas conforme o filme avança. O filme parece se perder em suas próprias ideias, e da metade para o final não sabe mais o que quer ser. A trama de Jack sofre com uma superficialidade, que resume o personagem a um punhado pequeno de características, o tornando uma caricatura, tal como todos os outros personagens desse filme.

O sobrenatural aqui é um dos pontos que eleva o nível desse filme, porém como já dito, faltou coragem para expor mais essa faceta e explorar mais a possessão, o diabo. Faltou ser mais terror e menos domingo legal.

Na soma de tudo, é um bom filme, mas que se limita muito na forma de contar a sua história.